sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Os meninos desvalidos

Por Admarino Júnior

Em decorrência da ausência plena dos próprios autores e co-autores deste espaço de debate e discussão referente ao conhecimento Histórico, eu, sendo membro efetivo e afetivo dos Goliardos, talvez o “líder” deste grupo que vem crescendo a cada dia, estou disposto a fazer algumas considerações sobre as minhas labutas intelectuais.

No geral, estamos atravessando o chamado rio mitológico Grego Aqueronte para chegarmos ao então sonhado Campos Elíseos e, por conseguinte, completarmos uma etapa importante de nossas vidas acadêmicas como graduando do curso de História na Universidade Federal do Pará. Estou fazendo alusão ao nosso trabalho de conclusão de curso que está iniciando neste mês de setembro e que estará presente em nossas vidas futuras.

Para inicio de conversa, o tema escolhido para a apresentação do meu projeto, antes de tudo, parte de uma premissa maior que passou a ser fundamental na História a partir de 1929 com a Revolução Francesa na historiografia promovida pelos historiadores Marc Bloch e Lucien Febvre, que proporcionaram um fazer histórico inovador que contrapunha aos positivistas e historicistas do século XIX. Além disso, contemporaneamente, esta premissa é observada sobre o olhar do Historiador Inglês Eric Hobsbawn. Refiro-me à idéia de que o historiador constrói o passado a partir do presente. Isto é, nós problematizamos e [re]construímos o passado partindo dos problemas do presente.

Vou explicitar melhor esta premissa com o tema que escolhi para o projeto. Diversas vezes andando pelas ruas e praças de Belém do Pará, deparei-me com diversas cenas intrigantes. Entre elas, está a de meninos pobres nas ruas e nos trânsitos pedindo esmolas ou qualquer mantimento para suprir suas necessidades, vivendo em condições miseráveis, sub-humanas e sem amparo e assistência do estado.

Com isso veio-me à idéia de como foi a tratado pelos governantes e pela elite dirigente as políticas públicas para “proteger” ou auxiliar os meninos ou crianças pobres e desvalidas do século XIX em Belém do Pará. E qual a idéia de infância que permeava na sociedade Belenense daquele período.

Haja vista que, inicialmente, partir do aporte teórico baseado no trabalho do Historiador Francês Philippe Áries, em sua obra “História social da criança e da Família” discorrendo que a idéia de infância é uma noção historicamente construída. Isto é, ao logo do tempo as transformações sociais são tão intensas que repercute na ação dos próprios sujeitos históricos, neste caso, as crianças.

Através disso, surge a minha problemática do passado: como ocorreu a configuração ideológica do estado e suas atuações de políticas públicas para a inserção de meninos desvalidos da fortuna para adquirir hábitos de trabalho profícuo, que os afastará da ociosidade, do vício e do crime.

Assim delimitei algumas coisas, entretanto, ainda falta reconfigurar o recorte histórico pretendido no projeto de minha pesquisa. Por conseguinte, o tema delimitado para a pesquisa será exposto aqui a “todos os simpatizante de nossa fé” (conhecimento histórico):

A EDUCAÇÃO DOS MENINOS DESVALIDOS DA FORTUNA EM BELÉM DO PARÁ – SÉCULO XIX

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quinta-feira, 10 de setembro de 2009



O LEITOR

BERNHARD SCHLINK


Não raro, a literatura, mesmo a de ficção, tem o poder de melhor problematizar o passado do que a própria escrita da história. A afirmação é bastante forte (e também polêmica), mas, no fundo, bastante verdadeira. O caso de "O Leitor" (The Reader), de Bernhard Schinlk, é um bom exemplo.

Na ainda destroçada Alemanha dos anos 1950, o adolescente Michael Berg conhece Hannah, mulher vinte anos mais velha, com quem inicia um caso amoroso. A relação dos dois é marcada pela descoberta do sexo, do mundo da literatura e por diversos mistérios. Michael e Hannah parecem viver apenas o presente. O passado fica no passado. Certo dia, Hannah deixa Michael sem nenhuma pista sobre o seu paradeiro. Michael sofre, consegue tocar sua vida, mas sempre se pergunta se havia feito alguma coisa errado. Teria ele traído a confiança sua amada?

Anos depois, os dois se reencontram, mas em um contexto muito diferente. Ele, como estudante de Direito que acompanha um julgamento sobre crimes de guerra. Ela, no banco dos réus, acusada de atrocidades em um campo de concentração nazista. Hannah parece não se defender corretamente. Omite informações, perde oportunidades para atenuar sua sentença. Pouco a pouco Michael descobre o motivo: Hannah guarda um grande segredo, do qual Michael tomara contato anos antes, mesmo sem se dar conta.

A partir daí, Michael passa a ser atormentado por diversas questões: deve ele contar para o juiz o que sabe, mesmo correndo o risco de trair a confiança de Hannah, que parece querer manter o sigilo? Como conciliar o seu amor por Hannah com o fato de ela ter sido guarda de prisão em um tempo tão tenebroso da história?

"O Leitor" é um livro de múltiplas camadas e nuances. Na Alemanha e em outros países onde o livro foi traduzido, sua leitura chegou a causar mal-estar, já que fora equivocadamente lido como uma defesa de uma criminosa nazista. Na verdade, o livro não é nada disso, mas sim uma obra complexa sobre amor, vergonha, piedade e, sobretudo, as feridas de uma geração, a ambivalência e os medos dos seres-humanos. O livro de Schlink escapa do lugar-comum de obras sobre o Holocausto. Ao invés de culpa - coletiva ou condenações, os personagens não justificam seus erros, mas os reconhecem e, com base neles, estabelecem relações tensas e conflituosas, algo que está muito mais próxima de nossa realidade.

Escrito com grande sensibilidade e estética fina, "O Leitor" ganhou uma adaptação também muito boa para o cinema. Acompanhar Michael é uma missão solitária, mas não melancólica. É uma vida que busca libertação, que busca compreender o outro e a si mesmo, uma luta pelo direito de viver.

Em certo momento do livro, ao refletir sobre a própria geração, Michael (no fundo, Schlink) afirma para si mesmo: "Não devemos ter a pretensão de compreender o que e incompreensível, não temos o direto de comparar o que é incomparável, não temos o direito de investigar, porque quem investiga, mesmo sem colocar nas perguntas as atrocidades, faz delas objeto da comunicação, não as tomando algo diante do que só se pode emudecer, horrorizado, envergonhado e culpado."

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Diário de um "professor".

Por Romyel Cecim.



Faço parte de um projeto da Univerisade Federal do Pará, elaborado pelo professor Mestre José de Moraes, que objetiva o ensino de jovens e adultos através de uma dinâmica de interdisciplinaridade, dando ênfase também para a abordagem de assuntos relacionados com o cotidiano dos alunos, como a vida rural e as relações sócio-ambientais.
Deste modo postarei um diário cujo contúdo expressará minha relação e aprendizado com os alunos do EJA (educação de jovens e adultos) da escola Teodomira Lima no município de Bragança, Pará.

RELATÓRIO SOBRE AS AULAS NO TEODOMIRA LIMA, PELO PROJETO DE                                                                                       INTERDISCIPLINARIDADE DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ.

 

 

1ºDia: 27/04/2009

Neste primeiro dia de participação nas aulas do EJA (Educação de Jovens e Adultos), na Escola Estadual Teodomira Lima, na turma da professora Ruth, me deparei com uma turma um tanto quanto interessante para minha mente fechada de aluno universitário, acostumado ás salas de aulas tradicionais. Lá me deparei com  crianças, jovens, adultos e idosos compartilhando o mesmo espaço e a mesma mestra. Após alguns minutos de um aguçado olhar de minha parte para com os alunos, a professora chegou e iniciou sua aula com uma oração. Após a oração, a mesma me apresentou para a turma intitulando-me como professor de História.

Apresentei-me á todos e expliquei o objetivo do projeto elaborado pelo professor José de Moraes, que corresponde á uma forma de ensino de jovens e adultos de uma forma diferenciada: abordando temas pelas óticas de várias disciplinas e interligando-as tentando provar que, assim como na vida, a educação não existe de forma isolada em blocos, mas sim de forma interativa entre as disciplinas que a compõe. Sempre colocando em sala de aula a realidade dos alunos.

A proposta foi muito bem aceita pelos alunos, mostrando-se empolgados pela oportunidade de serem “pioneiros”, nas palavras do aluno Seu Mário, de uma “revolução” (segundo o senhor Joaquim) no ensino brasileiro. Em seguida, demonstrei através de uma conversa interativa que teve por tema o “corpo humano”, que o assunto podia ser abordado através de diversas disciplinas ou matérias, o que os deixou bastante entusiasmados.

Na busca de uma maior interatividade com os alunos propus que fizéssemos a dinâmica do espelho, que consistiu em apresentá-los á uma “pessoa” em uma sala separada e os alunos deveriam descrever esta pessoa. Na sala havia apenas um espelho e os estudantes deveriam se olhar e pensar no seu próprio corpo e em sua personalidade e em como deveriam melhorar para se tornar pessoas melhores na sociedade em que vivem. Após a observação, todos deram o testemunho sobre sua forma de ver á si próprio, o que me permitiu conhecê-los um pouco melhor.

Para finalizar, dialogamos sobre o nosso corpo e como devemos utilizá-lo para uma melhor convivência em sociedade, de modo que pude perceber como todos são incrivelmente simples e humildes, mas ao mesmo tempo perseverantes e determinados.

 

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Por que ler Hobsbawm?

Admarino Júnior ( adaptado do texto composto por Bruno Fiuza )


É muito difícil encontrar um intelectual que seja um consenso acima de posições políticas, origem social, credo religioso etc. O britânico Eric J. Hobsbawm chega perto de ser um desses raríssimos casos. O relançamento, pela Companhia das Letras, de O novo século é um convite para revisitar a obra dessa verdadeira lenda viva. No livro, que é a transcrição de uma entrevista concedida por Hobsbawm ao jornalista italiano Antonio Polito em 1999, o historiador britânico apresenta um rico e lúcido prognóstico sobre o mundo às portas do século XXI.

Nascido em Alexandria, no Egito, em 1917, Hobsbawm se tornou um ícone pop por conseguir fazer, como poucos, a ponte entre as áridas pesquisas de ponta produzidas na academia e o grande público. Ao longo de mais de 50 anos de carreira, ele se destacou por ser aquilo que o jargão acadêmico chama de “historiador de síntese”. Ou seja: além das pesquisas que ele mesmo desenvolve, Hobsbawm se tornou um erudito capaz de condensar o resultado de estudos sobre os mais variados temas em obras que apresentam uma visão de conjunto sobre um determinado período histórico.

Ao adotar essas abordagens amplas, apresentou uma leitura da história contemporânea que até hoje orienta os estudos de pesquisadores em todo o mundo. Ele divide a história dos séculos XIX e XX em quatro grandes eras: a das revoluções, a do capital, a dos impérios e a dos extremos.

Não por acaso esses são os títulos dos volumes que compõem a sua “quadrilogia” clássica. Em A era das revoluções ele analisa o período das grandes transformações desencadeadas pela Revolução Francesa no fim do século XVIII, evento fundador do mundo contemporânea; em seguida ele esmiúça o processo de desenvolvimento do capitalismo na Europa entre 1848 e 1875 em A era do capital; na seqüência vem A era dos impérios, obra na qual explica as origens e as conseqüências do imperialismo do final do século XIX e início do XX. A série termina com o seu livro mais famoso, A era dos extremos, no qual faz uma brilhante radiografia do mundo bipolar do século XX, que segundo ele começou em 1914, com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, e terminou em 1991, com o colapso do socialismo real e o fim da União Soviética.

Se Hobsbawm tivesse parado por aí já seria o suficiente para colocá-lo na galeria dos grandes historiadores do século XX, ao lado de Lucien Fevbre, Marc Bloch, Jacques Le Goff, E.P. Thompson e tantos outros. O que o diferencia dos demais, no entanto, é que Hobsbawm continua vivo e bastante ativo.

É isso o que torna O novo século tão instigante: das páginas do livro surge um intelectual em sintonia com seu tempo, que não tem medo de usar a história para explicar o mundo em que vivemos hoje. E faz isso com maestria, diga-se de passagem.

Ler O novo século hoje é ainda mais interessante do que na época em que foi lançado originalmente, em 2000. Agora, as “profecias” feitas por Hobsbawm na virada do milênio podem ser confrontadas com as análises que ele mesmo fez já dos primeiros anos do século XXI em seu último livro, Globalização, democracia e terrorismo, publicado também pela Companhia das Letras no final de 2007.

Ao lado de suas obras clássicas, esses dois livros mais recentes fazem de Hobsbawm um sério candidato a se tornar não só um dos maiores historiadores do século XX, mas também do início do século XXI. Mas isso, só a história poderá julgar.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Entrevistado: Hilário Franco Júnior (USP)

Por Admarino Junior (retirado da rede Café-história)

O papo é com o professor Hilário Franco Júnior, um dos maiores historiadores brasileiros em atividade. Na agradável entrevista concedida ao Café História, o professor Hilário contou como começou sua curiosa trajetória na área de história, além de comentar sobre questões contemporâneas e sobre suas atuais pesquisas. Não perca uma linha sequer!

Medievalista, professor do Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP), Hilário Franco Júnior possui toda a sua formação na área de história, tendo feito seu pós-doutorado com Jacques Le Goff na École des Hautes Études en Sciences Sociales. Hilário é especialista em mitologia medieval e recentemente escreveu um livro sobre futebol e sociedade.

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CAFÉ HISTÓRIA - Professor, antes de tudo, gostaria de dizer que é um grande prazer para o Café História tê-lo como entrevistado. Bom, nossa primeira pergunta está relacionada à sua formação: como o Hilário Franco Júnior tornou-se um historiador? Quando começou seu fascínio pela profissão?

Na verdade minha trajetória é curiosa. Ao contrário do que aconteceu com muitos colegas, na escola a História não me atraía mais do que as outras matérias, ou seja, pouco. Nunca fui bom aluno. Sem saber muito bem o que fazer como faculdade, acabei indo por influência de amigos e da família para Administração de Empresas! Mas – veja como o destino pode ser curioso – na Fundação Getúlio Vargas onde eu tinha ingressado, o Centro Acadêmico dirigia um cursinho preparatório para os interessados em prestar aquele vestibular. Os professores do cursinho eram exclusivamente alunos da faculdade, e quando se formavam deixavam a função e havia um concurso interno para contratar outros alunos para dar aula aos vestibulandos. Logo no meu primeiro ano de curso abriu uma dessas vagas, prestei o tal concurso porque era um emprego bem pago e muito prático (eu seria aluno e professor no mesmo prédio). Ganhei uma das vagas de História Geral e um treinamento de um semestre antes de começar a nova função. Percebi então o óbvio: não sabia o suficiente para ensinar classes de cinquenta alunos, de forma geral de bom nível cultural. Comecei a estudar por conta própria e fui me envolvendo com a História. Mas ainda sem planos maiores nesse campo. Um amigo que ia prestar como segunda faculdade Ciências Sociais insistiu para que eu fizesse o mesmo com História. Prestei o vestibular na USP (provas somente dissertativas naquela época), passei, porém não me inscrevi. Eu não me via como definitivamente professor e pesquisador de História. Porém dois anos depois senti finalmente necessidade de uma formação específica, meu autodidatismo não me satisfazia mais. Fui me informar, e por um desses felizes (e raros!) mistérios da burocracia eu podia me inscrever sem novo vestibular. Foi o que fiz e o ambiente de Humanas me cativou de vez, enquanto cada vez mais me cansavam a Micro e Macro Economia, Estatística, Matemática Financeira (aghr!) etc. A Administração perdeu um ex-futuro medíocre administrador de empresas e a História ganhou um apaixonado adepto.

CAFÉ HISTÓRIA - Em “Apologia da História”, Marc Bloch fala sobre a felicidade de poder falar, no mesmo tom, aos doutos e aos escolares. Professor, uma das características de seus textos (entrevistas, livros, artigos etc.) é a linguagem acessível, mas sem abdicar do rigor acadêmico e de uma estética apurada. Falar para todos os públicos é realmente uma preocupação sua? Qual deve ser a relação entre historiador e sociedade?

Creio que não se deva estabelecer regras rígidas a respeito. É preciso respeitar perfis pessoais e projetos de vida intelectual. Alguns historiadores têm vocação para democratizar seus conhecimentos, outros não; e estes podem fazer excelente trabalho de pesquisa e mesmo de ensino para públicos especializados. No meu caso, acho que foi minha trajetória pouco ortodoxa que formatou o historiador que sou. Como disse na resposta anterior, precisei aprender a dar aula dentro da sala de aula, diante de alunos apenas dois ou três anos mais jovens que eu, muitos deles vindos de ambientes familiares propíceis às coisas da cultura. Eu lia muito, mas fui percebendo que nem sempre eram boas leituras, havia muita divulgação pouco rigorosa, daí a idéia de seguir a faculdade de História e conhecer o que se fazia de realmente científico no campo. Além disso, o fato de ter de ensinar a História do Egito faraônico à Guerra da Coréia acabou me sendo extremamente útil, permitiu uma visão de conjunto, o estabelecimento de comparações, não me fechou nos limites rígidos de uma especialização. Esta é, evidentemente, indispensável, mas DEPOIS de uma sólida visão de conjunto. Assim, tive de aprender a falar e a escrever para gente não necessariamente fascinada pela História. A tarefa de fascinar cabe ao professor, e para isso o primeiro passo é ser claro, escapar dessa praga de discursos pedantes, politicamente corretos, pretensamente científicos e que escondem vanidades e chavões. E de fato, é um grande prazer transmitir – oralmente ou por escrito --- determinado conteúdo e perceber que o público te compreende e se interessa pelo assunto.

CAFÉ HISTÓRIA - Em seu livro “A Idade Média – Nascimento do Ocidente”, o senhor observa que mesmo aquelas sociedades que não possuem um passado medieval, vêem nos últimos anos entendendo a importância do estudo desse período histórico, uma vez que ele possui um papel decisivo para a formação da civilização ocidental. Tomando o Brasil como exemplo, essa ligação com o universo medieval é vista com relativa facilidade quando observamos muitas de nossas tradições religiosas. Mas qual a relação que áreas como a política, cultura ou economia possuem com esse mesmo universo medieval?

Do ponto de vista político, podemos lembrar das “dinastias” do Norte-Nordeste como os Magalhães, Sarney ou Barbalho, bem como da “feudalização” que os vereadores promovem em muitas cidades, inclusive São Paulo há alguns anos. Do ponto de vista social, a fragilidade institucional, a baixa consciência de cidadania, a grande indistinção entre coisa pública e coisa privada, o nepotismo, o corporativismo, são ecos dos elementos medievais aqui introduzidos pelos colonizadores portugueses. Do ponto de vista cultural, não é preciso insistir que nossa língua nasceu na Idade Média e que, aliás, falamos no Brasil um português muito mais próximo ao medieval do que ocorre em Portugal atual. Além disso, a literatura de cordel e seus temas cavaleirescos, carolíngios e arturianos são outros testemunhos de nossa medievalidade. Como essa relação entre Brasil e Idade Média é mais complexa do que podemos conversar aqui, tomo a liberdade de indicar para os interessados um artigo que publiquei a respeito no ano passado: “Raízes medievais do Brasil”, Revista USP, 78, 2008, pp.80-104.

CAFÉ HISTÓRIA - Durante muito tempo, medievalistas discordaram a respeito da periodização da Idade Média. Existe algum consenso hoje em dia? Onde começa e onde termina a Idade Média? Existem marcos seguros ou eles serão sempre problemáticos?

Eles serão sempre problemáticos, porque decorrem evidentemente muito mais do arbítrio do historiador do que dos fatos pretensamente classificadores. E como o historiador é produto de seu presente, e este muda, as classificações periodizantes mudam. Esta questão já gerou inúmeros debates, como se sabe, mas talvez no fundo seja um falso problema. Pouco importa rotular o fim da Idade Média em 1453, 1492, 1517 ou, como fez Jacques Le Goff mais recentemente, 1800. Na adoção de qualquer uma dessas fronteiras cronológicas todas há muito de “reserva de caça” de domínios científicos. O verdadeiro especialista não se coloca uma camisa de força, prefere periodizações amplas e flexíveis. Como se pode ser especialista do século XIV, por exemplo, sem conhecer profundamente os séculos XI-XIII numa ponta e XV-XVI na outra? O fundamental é ter consciência que a História de qualquer época comporta diferentes planos, cada um deles com ritmos próprios. Privilegiar 1453 é dar maior importância à política, escolher 1492 é colocar a economia à frente de tudo, 1517 é pensar que a religião está no centro da sociedade, e assim por diante. Portanto, o recorte temporal depende do objeto estudado, e no caso de uma visão ampla sobre muitos séculos (Idade Antiga, Média, Moderna) o melhor é não adotar fronteiras e sim zonas fronteiriças.

CAFÉ HISTÓRIA - Nos últimos anos, é notório o clima tenso entre as religiões monoteístas. Judeus e muçulmanos intensificam o confronto no Oriente Médio. Bispos da Igreja Católica criam mal-estar com judeus ao negar o Holocausto. Só para citar dois exemplos. Analistas, na mídia, evocam o passado para explicar a origem dessas tensões. As tensões religiosas da Idade Média explicam, de fato, esse cenário contemporâneo?

Temos aí um bom exemplo dos usos “politicamente corretos” e cientificamente incorretos da História. É mais fácil debitar a responsabilidade de certas situações atuais a séculos remotos, a atos tornados anônimos pelo tempo, do que inculpar o passado recente, de nossos pais, avós ou bisavós. Claro que as Cruzadas dos séculos XI-XIII despertaram nos ocidentais fortes sentimentos antisemitas, isto é, contra judeus no interior da Cristandade, contra árabes no exterior. Mas isso não explica os choques intersemitas (árabes contra judeus,judeus contra árabes) atuais, que decorrem das duas grandes guerras mundiais do século XX. Certa crise de consciência colonial, sobretudo inglesa, e certa crise de consciência ocidental em relação aos judeus massacrados pelos nazistas, levaram ao nascimento artificial e autoritário do Estado de Israel, construído por ocidentais (judeus e cristãos) à custa da população palestina lá instalada há séculos. O argumento “histórico” a favor da decisão é claramente falacioso: aquela é a terra de origem dos judeus. Mas a América é a terra de origem dos indígenas e ninguém pensa em expulsar os brancos e devolvê-la aos seus ocupantes originários. O argumento “moral” não é menos tendencioso: os judeus foram objeto de genocídio por não terem seu próprio país. É verdade, e esse fato extremamente grave e condenável não pode ser esquecido, mas é verdade também que as potências ocidentais nada fizeram diante de outros genocídios, como o dos armênios por parte dos turcos entre 1915 e 1917 ou o dos tutsis (75% da população eliminada!) de Ruanda em 1994. A rigor, Israel nasceu de conjunção de interesses entre a direita religiosa judaica e as potências ocidentais que desejavam se manter próximas das fontes petrolíferas árabes. Em suma, são questões geopolíticas do século XX que explicam o problema, não questões religiosas da Idade Média.

CAFÉ HISTÓRIA - Os historiadores dos Annales são responsáveis por grandes transformações da historiografia ocidental. O senhor chegou a trabalhar com algum desses historiadores? Do ponto de vista de suas pesquisas, qual desses historiadores mais o marcou e por quê?

Fiz meu pós-doutorado com Jacques Le Goff, grande intelectual e grande pessoa, e evidentemente ter tido contato com ele pelo menos uma vez por semana ao longo de dois anos e meio deixou marcas importantes na minha visão da História. Nossos encontros periódicos mantêm-se até hoje, embora mais espaçados, e mesmo os temas históricos tendo deixado de serem o centro de conversação, já que nossa relação passou a ser mais pessoal, são sempre encontros muito estimulantes. E sua obra continua significativa para mim, em especial por aliar erudição e imaginação no contato com as fontes. De Georges Duby, a quem não conheci pessoalmente, tiro sobretudo a valorização da escrita historiográfica : ele mostrou que um grande historiador não precisa -- não deve -- escrever de maneira hermética em nome de uma pretensa seriedade científica. Marc Bloch, o mestre deles dois, me inspira pelas preocupações metodológicas e pela ousadia na escolha dos temas estudados. Da mesma geração que eu, mantenho contatos estreitos e profícuos com Jean-Claude Schmitt, o principal discípulo de Le Goff.

CAFÉ HISTÓRIA - O senhor é bastante conhecido por seus trabalhos no campo da mitologia medieval. No entanto, recentemente, lançou o livro "A Dança dos Deuses - Futebol, Sociedade e Cultura", pela Companhia das Letras. Isso indica uma mudança em suas pesquisas acadêmicas? Conte mais sobre esse e outros projetos em vias de produção.

O livro sobre futebol abriu, efetivamente, outra frente de interesse, o que não significa abandono dos estudos medievalísticos. Vou, na verdade, tocar ambas as frentes paralelamente, antes de abrir uma terceira e talvez uma quarta. No que diz respeito ao futebol, a motivação é simples: refletir sobre um fenômeno sóciocultural de amplo alcance e até agora desprezado pela Universidade, que o abandonou nas mãos de jornalistas, cujo interesse e abordagem são outros. Nesse campo tenho encaminhado um livro de ensaios que não sairá antes de dois ou três anos, é um conjunto de pequenos textos que ou estão sendo escritos ao acaso de convites ou que não puderam ser aproveitados em “A dança dos deuses” devido ao tamanho do livro. No que diz respeito à medievalística, sairá em junho deste ano o volume II (e nova edição do vol.I) dos “Ensaios de mitologia medieval”. No momento trabalho também numa análise de conjunto sobre as utopias medievais, que será objeto do próximo livro, não sei ainda exatamente para quando.

CAFÉ HISTÓRIA - Professor Hilário, chegamos ao fim de nossa entrevista. Gostaria de pedir ao senhor duas coisas. Primeiro que deixasse uma mensagem para os membros do Café História, em sua maioria professores e alunos de história. Por último, que indicasse algum bom novo livro sobre Idade Média para nossos leitores medievalistas. No mais, foi um prazer entrevistá-lo. Muito obrigado pela entrevista e um forte abraço em nome de todos da rede.

É sempre um prazer conversar com gente interessada por História e que tenta difundi-la de maneira ampla e correta como faz o Café História. A mensagem que deixo aqui é simples e bem pouco original: o verdadeiro estudo da História é uma atividade intelectual riquíssima, que alia domínios diversos como política, filosofia, psicologia, literatura, artes plásticas, religião, dentre outros, e por isso mesmo pressupõe acúmulo informativo e esforço reflexivo. Minha sugestão enfática é que todo interessado pela História rejeite grandes modelos supostamente explicativos de tudo, mantendo o espírito aberto e mergulhando na leitura, sobretudo das fontes primárias. Quanto à indicação de uma publicação recente, como conversamos sobre as fronteiras entre Idade Média e Idade Moderna e sobre a Escola dos Annales, penso que uma boa sugestão seja a tradução brasileira que acaba de sair do maior livro de Lucien Febvre, fundador dos Annales ao lado de Marc Bloch: “O problema da descrença no século XVI. A religião de Rabelais”, editado pela Companhia das Letras.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

O Bento...

Por Admarino Júnior
















A foto acima mostra duas verdades.
A primeira já sabemos: os sacerdotes adoram criancinhas.
A segunda só os mais atentos perceberão:
O que o Papa leva em seu dedo anelar resolveria o problema
de quem ele leva em suas mãos.

Em visita a África, Bento XVI fez uma missa em Angola ao ar livre
para uma multidão. Por causa do forte calor muitas pessoas
desmaiaram e passaram mal. Dezenas ficaram feridas e dois jovens
morreram pisoteados no tumulto para entrar no local da missa.
É impressão minha ou os Angolanos estavam melhores sem o Papa?

O Pontífice apelou para que os angolanos deixem a feitaçaria de lado
e parem de ser oprimidos pelos demônios. Um bom slogan pra essa
camapanha seria: "Não deixe os demônios pisar em você. S
e quer ser pisoteado venha pra minha missa".

Bento XVI disse que foi embora da África triste pela fome.
Já os africanos ficaram felizes com a vinda do Papa. Mas continuam com fome.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Ser Historiador

“Amo a História. Por isso sou historiador” [1]. Marc Bloch em Apologia da História ou Ofício do historiador já afirmava a fórmula/sentimento central que envolve este ofício. Ser historiador, um Bom historiador, requer atributos indispensáveis para a construção do conhecimento histórico: dedicação, paciência, erudição, curiosidade, disciplina, entre outros. Para isso tornamo-nos, por diversas vezes, caçadores, navegantes, detetives, e iniciamos nossas buscas e análises inferindo nas re(a)presentações simbólicas construídas por agentes históricos em suas realidades.

Todo ofício tem sua matéria prima, e por mais que o historiador tenha ampliado seu leque de extração com a História oral, com a cultura material, e outras formas de se fazer História – o que é de extrema importância para tal disciplina – o documento escrito ainda persiste como uma das fontes mais utilizadas nas pesquisas históricas, parecendo até haver um fetiche por parte do pesquisador/historiador.

Ao possuirmos contato com documentos do século XIX e XX, em visita ao Centro de Memória da Amazônia, podemos transpor nossa experiência bibliográfica. É um contato fundamental na vida de um graduando haja vista que aqueles documentos podem vir a ser seu principal instrumento de trabalho, e também pelo aprendizado incrível que é dialogar com documentos que nos levam a uma Belém cheia de processos, brigas, capoeiragem, raptos. Tais documentos tornam-se filmes em nossas mentes que se não fosse pela crítica aos documentos, tornar-se-iam realidades verídicas.

Durante o século XIX principalmente, a partir dos fins deste, com a escola histórica Positivista o documento fora tratado como representação única da verdade e o papel do historiador, de acordo com Jacques Le Goff em História e Memória, fora simplesmente “... tirar os dados dos documentos tudo o que eles contêm e em não lhes acrescentar nada do que eles não contêm. O melhor historiador é aquele que se mantém o mais próximo possível dos textos.” (p.536).

Com a revolução na historiografia proporcionada pela Ecolé dos Annales a relação documento/historiador vem ser modificada. Com a crítica aos documentos a produção historiográfica toma outro rumo. Para Le Goff, os fundadores dos Annales foram responsáveis por uma ampliação da noção de documento.

O documento é resultado de uma montagem, de uma escolha, de uma tentativa das sociedades históricas em se perpetuarem, suas representações, eles são uma construção humana que procuram a manifestação e representação de seus universos simbólicos. É condição sine qua non no trabalho do historiador percebemos que todo arquivo do passado é repleto de intencionalidade.

Sobre a labuta deste profissional e de como ocorre uma pesquisa historiográfica Antonio Otaviano, historiador e professor da Universidade Federal do Pará, no livro intitulado A inquisição e o Sertão alude-nos sobre as desenvolturas que fazem parte do ofício aonde “... cada descoberta, cada minuto dedicado à analise de fontes e cada trabalho lido efetivam uma jornada marcado por começo, desistências e recomeços”. (p.22).

Como um historiador navegante, o prof. Antonio Otaviano fala das dificuldades financeiras em se fazer pesquisas, dificuldades geográficas, metodológicas, impossibilidades, diante das mesmas procurar alternativas, aprofundar estudos a respeito do tema a ser estudado e assim por diante.

Conversar com a documentação é essencial no ofício do historiador, pois é na medida em que se fazem determinadas perguntas à fonte de pesquisa como: “Quem produziu o documento?”, “Qual lugar que ele fora produzido?” e “Por que fora guardado?” entre outras que se constrói uma história crítica.

Ser historiador é reconstruir uma realidade, se envolvendo em fluxos de acontecimentos que são construções realizadas pelos agentes históricos. Concordamos com Durval Muniz A. Júnior sobre a sua posição de não tomar a História de forma dicotômica onde sociedade/sujeito e natureza, subjetividade e objetividade estão em pólos opostos. A História para ter uma abordagem concreta desses “fluxos de acontecimentos” tem que envolver as transformações, mutações, ou para o próprio Durval Muniz tem que ser manter em uma terceira margem, margem das confluências de metodologias e abordagens.

A possibilidade de trabalharmos com fontes vivas, isto é, trabalharmos com indivíduos que de alguma forma fizeram parte do tema pesquisado compõe ofício do historiador. O trabalho com fontes orais, se observamos os critérios mais gerais, é similar àquele realizado com as documentos escritos, pois se todo documento é falso, conforme Le Goff, pois ele não passa de uma construção simbólica de determinada realidade, em uma entrevista, o testemunho também é falso, ou melhor, é uma das várias verdades que podem vir a existir, haja vista que eles também consistem em uma representação de como tais entrevistados viveram tal momento.

Verena Alberti em Fontes Históricas no capítulo Histórias dentro da História procura mostrar passos que devem existir na utilização de fonte oral na pesquisa histórica. A preparação das entrevistas, sua realização e seu tratamento. São itens que devem ser preparados de antemão pelo historiador, pois na hora da realização da entrevista servirá para nortear a pesquisa, estabelecer um método e como trabalhar tais fontes.

Definir o papel do historiador é complexo, pois não é como resolver uma equação. Na História, “2+2=5” pode vir a ser “verdade” dependendo de determinada representação. Portanto, ser historiador é uma profissão que requer uma critica textual e documental a todo o momento, pois nosso papel não é criar maniqueísmos, dizer o que estava certo ou que estava errado, identificar heróis ou vilões é sim tentar compreender a representação dos sujeitos e suas intenções de impor ao futuro imagens de si próprios, cabe-nos ver as “entrelinhas”. Diante de uma tarefa nada simples só podemos afirmar que: Ainda bem que amamos a História, por isso queremo-nos tornar Historiadores.

[1] Ver BLOCH, 2001.

Por Rafael Santos e Leandro Fonseca.

quarta-feira, 11 de março de 2009

HISTÓRIA DA FEIÚRA

O que é o feio? Por que o feio é feio? Por que o feio nos aterroriza? E por que também nos fascina? O célebre autor e intelectual italiano Umberto Eco investiga a feiúra e o fascínio exercido pelo feio no imperdível livro ilustrado "História da Feiúra". O volume oferece um painel extenso e surpreendente daquilo que foi considerado feio pelo homem durante a história conhecida do mundo ocidental. Rostos horrorosos, narizes enormes, verrugas, pele flácida, membros gordos e centenas de outras imagens poderosas retratam o grotesco, o feio, o cruel e o demoníaco. Depois de registrar, em "História da Beleza", o curso do belo na civilização ocidental, Umberto Eco se volta agora para a feiúra e nos faz refletir: se beleza ou feiúra estão nos olhos de quem vê, também é certo lembrar que esse olhar é influenciado pelos padrões culturais de quem observa.

domingo, 1 de março de 2009

NOVA ESCOLA


*Por Admarino Júnior
/Refletindo a História.

Quase todo historiador também acumula o ofício de ser educador, infelizmente são poucos acreditam na educação como instrumento revolucionário na vida dos sujeitos, pois, temos que conviver com aqueles que desconhecem a prática de educar e se habituaram a ser hostil, olhar com certo desdém, e na maior parte das vezes negligenciam essa questão. A esses indivíduos que são a escória deste ofício, vai um alerta: "Um homem só se torna homem, quando passa a acreditar em uma causa ou um ideal."
Acreditar no ofício de ser um educador, é sobretudo ensinar para a vida e não apenas direcionado a conteúdos. Educar crianças, jovens e até mesmo adultos é um desafio e tanto. Também é preciso estudar, pesquisar, experimentar e, sobretudo, compreender, caso contrário, será sempre um ser passivo e alienado.

Infelizmente, faculdades de História (e das demais disciplinas) nem sempre discutem temas pedagógicos de maneira satisfatória. Por isso, o historiador se vê obrigado a procurar tais temas em outros espaços, em outros momentos. E não há nada de errado com isso, pois quem educa está em formação continuada para sempre.

Quem quiser discutir e conhecer um pouco mais sobre temas como didática, avaliação, educação especial e outros assuntos que integram a prática didática, pode acessar o ótimo site da revista "Nova Escola". Com uma equipe altamente capacitada, a revista é recomendada para todo tipo de educador. O site - a revista também é vendida nas bancas - traz reportagens na íntegra, além de edições antigas e seções multimídia.

referência: site do café História/adaptado.


*Graduando em Licenciatura e Bacharelado em História (Universidade Federal do Pará), Graduando em Licenciatura Plena em Pedagogia (Centro Federal de Educação Tecnológica do Pará) e Bolsista do Projeto Sistematizando Fontes em História da educação Profissional no Pará (séculos. XIX e XX)./ FAPESPA.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

CHE - O FILME





Continua rendendo boas histórias a vida e a luta de Ernesto Guevara, o Che. O filme da vez leva seu nome, tem uma grande produção internacional por trás e acabou crescendo tanto que virou não um, mas dois longas-metragens: “Che - O Argentino” e “Che – A guerrilha”.

Dirigidos por Steven Soderbergh os dois filmes trazem o ator porto-riquenho Benicio Del Toro como o personagem-título. E Rodrigo Santoro, em mais um de seus trabalhos internacionais, também está no longa, interpretando Raúl, irmão de Fidel Castro (Demián Bichir).

“Che” tem início no México, em 1955, quando Fidel e Ernesto Guevara se conhecem –o primeiro já planejava a Revolução Cubana, que consistia em derrubar o general Fulgêncio Batista do poder (ação que já havia sido tentada anteriormente, em 1953, mas falhou). No ano seguinte, as duas lideranças do movimento navegam até Cuba com mais 80 rebeldes para dar início à ação, que consistia na mobilização de camponeses e, com um exército cada vez maior, a conquista do poder na ilha.

Durante esse perído, Che e Fidel seguem por caminhos distintos, cada um liderando sua coluna, e as câmeras de Soderbergh acompanham apenas Che, com eventuais encontros entre os dois. O argentino lidera seu grupo com pulso forte, exigindo que todos tenham bom comportamento (condenando à morte os que roubavam ou violentavam mulheres), ajudando na alfabetização de seus homens e dando liberdade para aqueles que quisessem desistir da luta. Médico, ele tratava dos doentes e feridos, e em troca recebia fidelidade e cuidados durante suas fortes crises de asma.

Ao mesmo tempo em que retrata a caminhada de Guevara pelo interior de Cuba –pela selva e por pequenos povoados–, o filme revela cenas do guerrilheiro em Nova York durante os anos 60, em seu discurso na ONU e durante uma entrevista. Num dos trechos, a jornalista quer saber: “O que é mais importante para ser um guerrilheiro?”. Che não precisa oensar muito para responder: “Amor”. E explica que sem verdadeiro amor à causa pela qual se está lutando, nenhuma revolução pode ser realizada.

Foi assim, com inteligência, sensibilidade e até um pouco de ironia, que Guevara se transformou num dos maiores ícones da Revolução Cubana, adorado pelo povo que o adotou com se ele fosse um dos seus. Mas o sonho de Che era maior: ele queria promover a revolução em toda a América Latina. E é justamente dessa ambição que surge o segundo filme, “Che – A guerrilha”, mostrando as andanças do médico pelo interior da Bolívia, tentando repetir o feito cubano. E, como a história mostrou, não sendo bem-sucedido.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Ensino de História

Por Admarino Júnior*

Para que serve a História? Ou melhor, Porque devemos estudar História? Acredito que tais indagações, sejam habituais nos pensamentos dos sujeitos, sobretudo, no processo de ensino da disciplina História. Haja vista que, dar um sentido a esta disciplina, é um fator imprescindível que deve ser encarado pelos profissionais da área. E, por conseguinte, promover a formação do cidadão crítico e reflexivo consciente de ser um sujeito histórico de seu tempo (presente).

Gostaria de chamar a atenção dos nossos seguidores e simpatizantes da nossa “Fé”, neste texto, que o conhecimento histórico está presente no cotidiano das pessoas, e no âmbito escolar, dos educandos. Neste caso, ensinar exige respeito aos saberes dos educandos, ou seja, estabelecer relações entre os conteúdos e seus saberes prévios é dar sentido ao ensino e, sobretudo de História.

Observando os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’S) de História do ensino Médio, que busca estabelecer diretrizes para o ensino, explicita como objetivo de ensino da disciplina:

“(...) a superação da passividade dos alunos frente à realidade social e ao próprio conhecimento, faz-se necessário levá-los ao desenvolvimento de competências e habilidades que possibilitem a compreensão da lógica dessa realidade e da construção do conhecimento.” (PCNEM, 1999, p. 74)

Por outro lado, esta proposta dos PCN’S vem sendo profundamente ignorada pelos pseudo-professores, principalmente por aqueles que em processo de formação, incidem criticas sem procurar apresentar uma proposta de reformulação. Desconhecendo a égide do ensino, cometendo vitupérios e descomprometidos com a ética e estética do processo.

Diante disso, acredito que o conhecimento histórico, no momento, busca estabelecer diálogos com o seu tempo, reafirmando o adágio que “toda história é filha do seu tempo.” Sendo que os Profissionais da área deveram instigar os educandos a abandonar a curiosidadade ingênua, passando a adentrar na curiosidade epistemológica. Filosoficamente, a primeira está na esfera da alienação. Já a segunda no campo da criticidade.

Na verdade, a curiosidade ingênua que, “desarmada”, está associada ao saber do senso comum, é a mesma curiosidade que, criticizando-se de forma cada vez mais metodicamente rigorosa, torna-se curiosidade epistemológica.

Então, promover essa transformação é uma condição sine qua non no processo de ensino-aprendizagem da disciplina História e, por conseguinte, no processo da formação do professor de História.

Refletindo a História. JUNIOR, Admarino.

*Graduando em Licenciatura e Bacharelado em História (Universidade Federal do Pará), Graduando em Licenciatura Plena em Pedagogia (Centro Federal de Educação Tecnológica do Pará) e Bolsista do Projeto Sistematizando Fontes em História da educação Profissional no Pará (séculos. XIX e XX)./ FAPESPA.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Representações dos Tipos Brasileiros na virada do século XIX para XX.

Análise realizada pelo Goliardo Rafael Santos*

O que é o Brasil? Como é construída uma identidade nacional? Tais indagações são uma problemática que desde finais do século XIX surgem através de diversos intelectuais que procuram buscar e definir em que se constitui o Brasil e por quem ele é formado. Segundo Iara Lis Schiavinatto Carvalho Souza no ensaio intitulado “Sobre o tipo popular – imagens do(s) brasileiros(s) na virada do século” em 1870 houve uma labuta intelectual e cultural intensa, relacionadas aos indivíduos sociais (os tipos sociais) passíveis de representação do homem brasileiro.

Em sua abordagem Iara Schiavinatto começa fazendo alusão ao Jeca Tatu, personagem criado por Monteiro Lobato. Personagem interiorano, Jeca Tatu é pobre, apático, fracassado, indolente, ocioso, síntese das mazelas brasileiras. A visão que Lobato possui do trabalhador rural era constituída no Jeca Tatu, alguém inapto à civilização aos moldes europeus.

Para Schiavinatto “... o Jeca foi um tipo representativo do país, com todas as suas agruras, fraquezas e impotências (...) porque coincidia com toda uma compreensão oitocentista de boa parte das elites proprietárias do que era o trabalhador nacional” (SOUZA, 2002, p. 114). Ele, o Jeca Tatu, está intimamente ligado com uma série de problemas que o Brasil enfrenta desde a década de 1870, com aparecimento do movimento republicano, aonde o ideal de governar em nome do povo fazia com que se devesse conhecer o que é este povo.

Como constituir um povo brasileiro em meio a uma elite idealizadora de um trabalhador cujo refletia na figura do imigrante europeu, enquanto a massa nacional era constituída por negros e mestiços pobres? Nesta criação de uma figura simbólica representante do brasileiro, intelectuais como Aluízio de Azevedo, Lima Barreto e João do Rio entraram em cena.

A rua, conforme Iara Schiavinatto, é o lugar onde os tipos populares serão encontrados e representados por tais intelectuais. Esses tipos são diversos, baianas, senhoras nas casas de chá, homens de letras, o Zé povinho, entre outros que formavam um mosaico, uma cartografia dos tipos, aonde eram descritos o cotidiano desses tipos e até suas forças “políticas” que eram manifestadas na rua.

Vale ressaltar que na construção desses tipos, prevalecesse mais uma ordenação, representação e divulgação de tais tipos do que em construir um emblema único, totalizante da nação. Cada intelectual montava de acordo com seu modo os “tipos de rua”, que serão designados também como tipos populares.

As abordagens sobre o “tipo popular” brasileiro deram-se também na forma de desenho. Segundo a autora era uma pedagogia dirigida à população, a figura facilitaria a compreensão da mensagem, fazendo com que o desenho adquirisse uma enorme capacidade de se comunicar.

O trabalho criado na representação dos tipos sociais e sua transmissão à sociedade possui um objetivo: a educação seguida de melhorias sociais para o povo e através do povo. Nesse contexto, Roger Chartier em “O mundo como representação” vem abordar o poder que um texto pode ter em gerar práticas sociais em seus respectivos leitores.
Com o Jeca Tatu de Monteiro lobato os outros tipos sociais e, também, culturais limitou-se as demais figuras representativas do povo brasileiro. Pois deixou-se de lado a cultura vista nas ruas, a cultura dos atores sociais, deixando como afirma a autora “vestígios e respiradouros desses experiências” (p.132).

O fato de se ter uma variedade de tipos sociais representa a dinâmica ocorrida na sociedade brasileira na transição dos séculos, aonde surgiam novos agentes sociais que se procuravam enquadrar na movimentação social da mesma.



*Graduando em Licenciatura e Bacharelado em História (Universidade Federal do Pará) e Graduando em Licenciatura Plena em Ciências da Religião (Universidade Estadual do Pará).

Este trabalho foi avaliado pela professora Dra. Magda Ricci.

Conceito: Bom

Recomendações da docente: Não houve.

O colyseu: a arena de touros e toureiros do além-mar – Belém-Pará (1894-1900)

No texto “O colyseu: a arena de touros e toureiros do além-mar – Belém-Pará (1894-1900)” da aurora Maria de Nazaré Sarges, expõe-se as transformações urbanas decorrente da produção da borracha na virada do século XIX para o XX. Onde cenário citadino de Belém, passa por um processo de ajustamento mediante as políticas públicas de modernização e a busca pela concretização do projeto de civilização nos moldes europeus.

Desse modo, nesse cenário de metamorfoses, Maria de Nazaré Sarges aponta para as ressignificações na esfera do mundo do trabalho. Pois, além dos trabalhadores urbanos “especializados” como os tipógrafos, artistas, carpinteiros, sapateiros, alfaiates, e os “não-especializados” como os vendedores de rua, carroceiros e carregadores, configuraram simultaneamente, “ a nova ordem ditada pela ideologia do progresso.”

Nesse mesmo enfoque, a autora ainda faz alusão para a intensa política de imigração promovida pelo estado. Que se por um lado, havia o discurso de suprir a mão-de-obra e ocupar terras em abundância. Por outro, existia a tentativa de inserção do estrangeiro europeu, que eram símbolos de um modelo civilizador e que, por conseguinte, esteve vinculada a economia da borracha.

Esse processo imigratório trouxe forte influência da cultura estrangeira para a sociedade paraense da época, Esta assertiva, é corroborada pela autora no que concerne o papel do Colyseu Paraense. Práticas de touradas criadas em outubro de 1894 tendo como fundadores indivíduos conhecidos no meio comercial, que buscavam instituir “estratégias de sobrevivênvia, dando expressão a outras práticas, a outras formas de lazer, como as touradas...” repercutindo na esfera social paraense, gerando profundas discussões na imprensa.

Então, as transformações urbanas decorrente do projeto modernizador do estado culminaram num aparecimento de novos grupos étnicos – Portugueses, Espanhóis, Italianos, entre outros – gerando, por conseguinte, novas ocupações profissionais, que dentre outras, a de touteiros estava em foco. Possibilitando assim, uma reconfiguração do espaço social e cultural na esfera urbana belenense. Pois, a imigração era um fator imprescindível para as novas práticas.

Portanto, mesmo com a proposta de uma nova configuração para a cidade de Belém – projeto de civilização e modernização como reflexo da produção da borracha – os atores sociais considerados incompatíveis com esse projeto, continuam existindo e, por conseguinte, mantendo relações sociais de acordo com seus ofícios.

Desse modo, Maria de Nazaré Sarges ressalta uma nova forma de adequação do espaço urbano, destacando os estabelecimentos sociais. Pois, “no novo tecido urbano que se redesenha uma nova maneira de apropriação desse espaço urbano pelos trabalhadores deixa entrever a construção de uma nova sociabilidade e as dissonâncias que se estabelecem como mecanismos de sobrevivência desses grupos.”


*Resenhado por Admarino Júnior, Romyel Cecim e Leandro Fonseca